domingo, 10 de dezembro de 2023

Raízes!

Imagino assim o meu tio-avô David
a segurar o dedo do seu pai

São as raízes que amarram uma árvore ao solo e não deixam o vento arrancá-la. Assim acontece comigo que cultivo as minhas raízes para justificar a minha presença no mundo.

As palavras "pai incógnito" ou "filho natural" são como portas que se fecham sobre o nosso passado e não nos deixam ir mais além para conhecer a história dos nossos antepassados. E a falta de respeito pelos apelidos que eles usaram lançam uma nuvem que tudo obscurece.

A minha avó paterna Ana Maria foi registada com o apelido de Oliveira, mas era filha de uma mulher sem apelido nenhum - tinha sido colocada na "Roda" quando era bebé - e eu muitas vezes me pergunto quem será o responsável por esse apelido. A resposta que mais me ocorre é que o pai incógnito se chamava assim e a mãe quis que ela lhe ficasse com o apelido. Mesmo sem o pai a reconhecer como filha e o mundo nada saber sobre o assunto. Uma espécie de vvingançazinha feminina, que as mulheres, como sabemos, são o diabo em figura de gente.

Se me viro para o ramo materno da minha família, o avô da minha mãe era Sousa e também ela usou esse apelido, mas não o herdou do avô e sim da sua mãe que Sousa era também. A parte engraçada é que esse meu bisavô era filho de pai incógnito e a sua mãe só tinha o apelido de Martins. Onde foi ele buscar o Sousa então?

E mais vos conto ainda. O bisavô José João, era esse o seu nome de baptismo, teve muitos filhos e a todos deixou a herança de Sousa, venha lá o apelido de onde vier. Quatro dos seu filhos vieram aterrar aqui na Póvoa, o que justifica a minha vinda ao mundo, pois um deles engravidou a minha avó e depois pirou-se para França, de onde nunca mais voltou.

Este meu avô devia ser um homem de força, mesmo sem o conhecer sou obrigado a admirá-lo e prestar-lhe esta homenagem, aqui neste cantinho da internet (que ninguém lê, mas chega a todos os cantos do mundo) que eu reservei para falar dos que viveram antes de mim, as minhas raízes. E digo que ele era um homem e peras pelo que li nas entrelinhas do registo de baptismo do seu primeiro filho que recebeu o nome de David, como o pai da nação judaica.

A Maria Rosa que tinha uns apelidos, que me coíbo de mencionar aqui, a lembrar uma família cigana, conheceu o meu bisavô era ainda menor de idade. Isso não é defeito, nem doença contagiosa, por isso os dois foram-se enrolando, enrolando, até que ela ficou grávida. É muito natural, dirão os meus leitores, esses enrolanços, normalmente, acabam assim. Mas não é aí que está a piada, essa está no facto de ter sido o meu bisavô que levou o filho à igreja para ser baptizado.

E o pároco da freguesia também devia ser fresco para assar, pois perguntou ao pai da criança, sabendo-o solteiro, de quem era o filho e a que propósito era ele a vir baptizá-lo. Depois das necessárias explicações com que o meu antepassado o brindou, o pároco disse da sua justiça: - só te baptizo o filho se me prometeres voltar aqui com a mãe dele e te casares com ela.

E é aí que eu admiro o carácter do meu bisavô, um homem de palavra que, cumprindo a palavra que dera ao pároco da freguesia, lá voltou com a Maria Rosa para receber a sua benção. Se o filho dele, de seu nome António, tivesse seguido o exemplo do seu pai ... a minha avó Maria não teria morrido solteira! 

2 comentários:

  1. Logo no início da leitura das suas raízes senti uma punhalada no peito que me impediu da absorção dos resto do texto. Apesar de o ler todo.
    Sou filha natural de um homem que mesmo reconhecendo a legitimidade de eu ser sua filha, se viu impedido de me perfilhar.
    Tem toda a razão quando diz que há uma parte da nossa vida que fica mergulhada num espesso negrume, no meu caso, agravada pelo facto de minha mãe ter pegado em mim e na minha irmã e ter regressado à casa paterna, tinha eu 18 meses. Tivesse eu crescido na terra onde nasci - coisa que nunca lamentei - ter-me-ia dado ensejo de conhecer os avós paternos e os meios irmãos que nunca conheci.
    Peço-lhe imensa desculpa, a ideia era comentar as suas Raízes, mas como poderia eu adivinhar que me ia pregar uma rasteira? :(

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